O gavião e nós brasileiros

Pedro Jorge Ramos Vianna.

Economista. Prof. Titular da UFC

Moro na Aldeota, não sei se no “coração” ou nos “intestinos”. Não dou meu endereço por questão de segurança. Meu DEUS onde estamos?

Nesse endereço eu já tive experiências inéditas. Como visitas de morcegos que adentraram sem pedir licença no meu apartamento, sobrevoaram os espaços (não tiveram o desplante de “aterrissar”, mas vistoriaram todo o ambiente). Talvez não se tenham agradado e foram embora.

Mas, existiram outros casos. Um dia tive a visita de um urubu placidamente pousado em minha varanda; noutro ou outro urubu (ou talvez o mesmo), pois não tivemos a oportunidade de sermos apresentados, estava tranquilamente pousado no lado ocidental de meu apartamento. Em ambos os casos os convenci a voar para ouras plagas. As feias que me desculpem, mas a beleza é fundamental.

Mas, hoje, não, vou escrever sobre a beleza, sobre a elegância. Sobre a coragem de um Gavião.

Eu moro no décimo segundo andar e hoje tive uma experiência inédita. Estava na minha varanda, cuidando da minha horta quando passou muito pertinho, voando com a elegância que lhe é peculiar, um gavião. Não consegui descobrir-lhe a raça. Seria um carcará? Não sei. Ele passou e foi pousar em uma antena de um edifício do outro lado da rua. Seu porte elegante claramente demonstrava que ali estava um vencedor.

Por que vencedor? Pela simples sobrevivência em um ambiente hostil, pela luta diária de continuar vivo, pela luta pela procriação, pela preservação da espécie.

E nós brasileiros, escravos da rotina, da violência, vivendo cada vez mais em ambientes hostis, o que somos? Vencedores? Não, perdedores. Perdedores por não termos coragem de nos insurgimos contra este estado de coisas. Perdedores por votarmos em quadrilha no lugar de votarmos em partido. Perdedores por elegermos ladrões, calhordas, salafrários. Perdedores porque os honestos se escondem (acho até que têm vergonha de dizer que são honestos), fingem que não estão vendo, acreditam que nada lhes acontecerá.

Dada esta situação vale aqui transcrever dois poemas: um de Vladimir Mayakvsky, outro de Bertold Brecht.

A primeira, de Vladimir Vladimirovitch Mayakovsky

“Na primeira noite, eles se aproximaram e

colheram uma flor de

meu jardim.

E não dizemos nada.

 

Na segunda noite, já não

se esconderam, pisaram as

flores, mataram nosso cão.

E não dizemos nada.

 

Até que um dia,

o mais frágil deles, entra

sozinho em nossa

casa, rouba-nos a lua,

e, conhecendo o nosso

medo, arranca-nos a

voz da garganta. E

porque não dissemos

nada, já não podemos

dizer nada.”

Vladimir Vladimirovitch Mayakovsky

A segunda, de Eugen Bertold Friedrich Brecht

“Primeiro levaram os negros.

 

Mas não me importei com isso.

Eu não sou negro.

 

Em seguida levaram alguns operários.

Mas não me importei com isso.

Eu também não sou operário.

 

Depois prenderam os miseráveis.

Mas não me importei com isso.

Porque eu não sou miserável.

 

Depois agarraram uns desempregados.

Mas como tenho meu emprego

Também não me importei.

 

Agora estão me levando.

Mas já é tarde.

Como não me importei com ninguém,

ninguém se importa comigo.”

Eugen Bertold Friedrich Brecht

Até quando não diremos nada?

Até quando não nos importaremos com ninguém?

O Gavião é muito mais digno de admiração, que nós brasileiros.

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