Quais países despontam como favoritos para entrar no Brics?

Leandro Prazeres
Enviado da BBC News Brasil a Joanesburgo


A expansão do Brics, bloco que reúne o Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, é o principal tema da 15ª cúpula do bloco, que acontece de terça-feira (22/8) a quinta-feira (24/8), em Joanesburgo, na África do Sul.

O movimento é liderado pela China, que, segundo analistas, usa a influência de ser a segunda maior economia do mundo para ampliar o número de membros do grupo.

Apesar de países como Brasil e Índia terem resistido a esse processo nos últimos anos, observadores avaliam que as chances de que a expansão seja finalmente anunciada é maior agora do que em anos anteriores — não só pela pressão chinesa, mas também pela adesão da Rússia à proposta.

Ambos os países veriam no bloco uma alternativa para driblar um possível isolamento causado pela deterioração de suas relações com os Estados Unidos, apontam analistas.

Dentro da diplomacia brasileira, o temor era o de que um aumento no número de membros diluiria a influência do país no grupo. Por isso, o Brasil vinha defendendo que, antes de anunciar novos membros, o bloco deveria estabelecer critérios para essa expansão.

Um membro do governo brasileiro ouvido em caráter reservado disse à BBC News Brasil que a pressão chinesa estaria acelerando esse processo.

A decisão (por expandir ou não o bloco) deverá ser tomada durante uma reunião reservada entre os chefes de Estado do grupo marcada para a noite de terça-feira (no horário sul-africano), segundo fontes do governo brasileiro.

Apenas os líderes e dois assessores de cada país participarão do encontro.

Putin é o único que não participará presencialmente. Ele é alvo de um mandado de prisão expedido pelo Tribunal Penal Internacional (TPI) por supostos crimes cometidos durante a guerra na Ucrânia e decidiu fazer apenas encontros virtuais.

Lula e a primeira-dama caminhando em tapete vermelho ao descer de avião
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a primeira-dama Janja Silva na chegada a Joanesburgo; ele já sinalizou apoio à entrada de alguns novos membros ao Brics – YANDISA MONAKALI/GCIS/HANDOUT/EPA-EFE/REX/SHUTTERSTOCK

Mas a decisão, caso seja tomada, só deverá ser tornada pública nos dias seguintes.

Esta não seria a primeira ampliação do bloco. O Brics foi criado em 2006 e, inicialmente, não era formado pela África do Sul. O país se juntou ao grupo no primeiro movimento de expansão, em 2010.

Atualmente, os países do Brics representam 40% da população mundial e 26% de toda a riqueza gerada no planeta, com um produto interno bruto de aproximadamente US$ 26 trilhões (R$ 130 trilhões).

Segundo o Itamaraty, 22 países fizeram um pedido formal para aderir ao bloco. Entre eles, estão nações de diferentes continentes e regimes políticos como Arábia Saudita, Argentina e Argélia.

Três despontam como favoritos para serem os mais novos integrantes do Brics, segundo negociadores e membros do governo brasileiro ouvidos pela BBC News Brasil, enquanto outros têm chances, mas correm por fora.

Arábia Saudita

Negociadores apontam em caráter reservado que a Arábia Saudita é um dos que têm mais chances de entrar para o Brics entre todos os candidatos.

O país tem 35 milhões de habitantes e uma renda per capita de US$ 23 mil (R$ 115 mil) por ano, segundo o Banco Mundial. A título de comparação, a renda per capita brasileira é de US$ 8,92 mil (R$ 44,5 mil).

Dados oficiais apontam que a economia do país foi uma das que mais cresceu no mundo em 2022, com uma taxa de 7,3%.

Ainda segundo o Banco Mundial, o crescimento foi fortemente ancorado nas receitas do petróleo, que tiveram alta ao longo do ano passado. A expectativa para este ano, no entanto, é de que o crescimento desacelere, também refletindo a queda nos preços do petróleo.

A seu favor, o país tem o endosso da China e o fato de ser um dos países mais ricos em reservas de petróleo no mundo.

De acordo com a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), a Arábia Saudita tem reservas estimadas em 267 bilhões de barris de petróleo, atrás apenas da Venezuela, com 303 bilhões.

Tanta riqueza no subsolo se traduz em dinheiro em caixa — e obter mais recursos financeiros é uma das principais preocupações de negociadores do bloco, especialmente os do Brasil, conforme apurou a BBC News Brasil.

Os brasileiros tentam conciliar o movimento de expansão do Brics à ampliação do número de membros do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB na sigla em inglês), também conhecido como “Banco do Brics”.

O banco foi criado em 2015 e tem oito membros. Além dos cinco integrantes originais do bloco, fazem parte Bangladesh, Emirados Árabes Unidos e Egito.

O banco financia projetos de infraestrutura e saúde em seus países membros e vem sendo apontado como uma forma de driblar supostos entraves impostos de instituições multilaterais tradicionais como o Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional (FMI) a países em desenvolvimento.

Nos últimos anos, porém, o banco vem sofrendo para obter novas fontes de recursos.

Para além dos motivos econômicos, um ponto a favor da entrada da Arábia Saudita é o fator geopolítico.

A Arábia Saudita é um dos principais parceiros dos Estados Unidos no Oriente Médio. Ao mesmo tempo, China e Rússia estão com suas relações com os norte-americanos abaladas há alguns anos.

Dois homens passam em frente a painel de evento dos BRICS que mostra cinco bandeiras dos membros
Atualmente, o bloco inclui Brasil, Rússia, Índia, China e África – REUTERS/JAMES OATWAY

Nesse contexto, uma aproximação com um parceiro americano estratégico poderia ser vista como um enfraquecimento da hegemonia de Washington na região.

O país é comandado pela família Saud há décadas. Nos últimos anos, o príncipe herdeiro Mohammed bin Salman vem sendo apontado como o real líder do país.

Ele é alvo de críticas da comunidade internacional por alegadas violações de direitos humanos e é apontado como um dos responsáveis pelo assassinato do jornalista saudita Jamal Khashoggi, em 2018.

Do lado brasileiro, não haveria resistência à entrada dos sauditas. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), aliás, chegou a defender a entrada do país no bloco em uma conversa com correspondentes estrangeiros no início de agosto.

“Acho extremamente importante”, disse Lula, que, na mesma ocasião em que se mostrou favorável à entrada de mais um dos países tidos como “favoritos” a ingressar no bloco: os Emirados Árabes Unidos.

Emirados Árabes Unidos

O país tem uma população estimada de 9,35 milhões de habitantes e também fica no Oriente Médio. A renda per capital é de US$ 44,3 mil (R$ 220,7 mil) por ano.

O presidente do país, Mohammed bin Zayed Al Nahyan, é um dos mais de 40 líderes de fora do Brics que foi convidado a participar do encontro com chefes do bloco e que confirmou sua ida a Joanesburgo.

Assim como a Arábia Saudita, os Emirados Árabes Unidos têm sua economia fortemente baseada nas receitas petrolíferas.

A aproximação do país com o Brics começou há alguns anos. Em 2021, por exemplo, o país foi aceito como novo membro do “banco do Brics”.

Negociadores ouvidos pela BBC News Brasil afirmam que o país contaria com o apoio da China e não teria o veto explícito de nenhum dos outros membros do grupo.

Segundo eles, o fato de o país já ser um membro do “banco do Brics” é um ponto a favor, uma vez que isso representaria um ingresso extra de recursos na instituição.

Apesar da reticência do corpo diplomático brasileiro em relação à inclusão de novos membros nos Brics, Lula defendeu o ingresso do país.

“Obviamente eu não decido sozinho, precisa de todos os países decidindo isso”, disse o presidente brasileiro na conversa com correspondentes estrangeiros.

Indonésia

Outro país mencionado por negociadores brasileiros como um forte candidato ao Brics é a Indonésia.

O país de maioria islâmica localizado no Sudeste Asiático é um dos mais populosos do mundo, com 273 milhões de habitantes e uma renda per capita de US$ 4,3 mil por ano (R$ 21,4 mil), segundo o Banco Mundial.

Dados oficiais apontam que a economia indonésia vem crescendo a taxas aceleradas nos últimos anos.

Em 2022, por exemplo, a taxa estimada foi de aproximadamente 5,3%, segundo o Banco Mundial. Para 2023, a estimativa é de que a economia cresça 4,9%.

O presidente Joko Widodo deverá participar do evento na condição de convidado.

Ainda de acordo com membros do governo brasileiro ouvidos em caráter reservado, a Indonésia teria demonstrado menos interesse em participar do bloco que outros países (como a Arábia Saudita), mas sua eventual inclusão é vista como positiva, especialmente, pela China.

Quem corre por fora

Lula e Alberto Fernandez conversando em área externa
A Argentina, comandada pelo presidente Alberto Fernández, demonstrou interesse em fazer parte do Brics e contou com o apoio de Lula – JUAN IGNACIO RONCORONI/EPA-EFE/REX/SHUTTERSTOCK

Outros países que também demonstraram interesse em participar do Brics estariam, nas palavras dos negociadores brasileiros, “correndo por fora” na busca por um lugar no bloco.

Um deles é o Irã, que, nos últimos meses, segundo os negociadores, teria feito uma forte campanha por isso.

O país tem a seu favor o fato de manter boas relações com todos os países do bloco e ter aceito a mediação chinesa em um acordo que reestabeleceu as relações diplomáticas com a Arábia Saudita, tida como arquirrival iraniana por décadas.

Por outro lado, apesar de os países terem voltado a se relacionar diplomaticamente, o histórico de animosidade entre eles é visto como um elemento que poderia, nas palavras de um negociador brasileiro, “incomodar” os sauditas, o que faz com que a candidatura iraniana seja vista com reservas.

A Argentina é outro candidato que desperta atitudes semelhantes no bloco. O país comandado pelo presidente Alberto Fernández demonstrou seu interesse em fazer parte do Brics e contou até com o apoio do presidente Lula.

Apesar disso, fatores econômicos e políticos fazem com que as chances argentinas sejam limitadas.

No campo econômico, o país vive uma crise de inflação alta, falta de liquidez em dólares e aumento da pobreza.

No campo político, o entrave é o fato de que a Argentina terá eleições presidenciais no próximo ano, o que gera incertezas sobre o futuro do país.

Nas prévias das eleições argentinas, o candidato de direita radical Javier Milei, oposição ao atual governo, foi o candidato mais votado, com 30% dos votos.

Membros do governo brasileiro afirmam em caráter reservado que a indefinição sobre quem irá assumir o governo na Argentina compromete as chances de o bloco aceitar a candidatura do país agora, uma vez que não há garantias de que um eventual governo de Javier Milei, que saiu à frente nas primárias, teria interesse em fazer parte do grupo.

Fonte: BBC News | Brasil
Fotografia: KIM LUDBROOK/EPA-EFE/REX/SHUTTERSTOCK

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