Bernd Debusmann Jr*
BBC News em Washington
Diante de uma multidão de apoiadores em Ohio, no início desta semana, o ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump fez uma promessa: um “grande anúncio” em 15 de novembro.
A data, acreditava-se, estaria exatamente uma semana depois de uma prevista “onda vermelha” de vitórias republicanas nas eleições de meio de mandato, que muitos observadores interpretavam como um teste decisivo de sua influência sobre o partido.
A onda, no entanto, quebrou como marolinha. O anúncio de Trump – provavelmente apresentando seu nome para a corrida presidencial de 2024 – deve vir após uma eleição em que muitos dos candidatos endossados por ele tiveram desempenho inferior ao esperado, o que deve aprofundar questionamentos sobre a viabilidade da marca “Make America Great Again” (Faça a América grande de novo, em tradução livre) como elemento permanente do conservadorismo dos EUA.
Talvez o mais preocupante para o ex-presidente tenha sido o sucesso retumbante nas urnas do governador da Flórida – e potencial rival de 2024 – Ron DeSantis, que conseguiu uma reeleição com melhoras significativas em todos os segmentos sociais – incluindo mulheres e latinos – enquanto suas tensões com Trump escalavam.
Mas afinal, até agora, como foi a noite das eleições de meio de mandato para Trump e o que o resultado deve significar para o futuro político dele?
Todos os olhos em Ron DeSantis
Enquanto os candidatos republicanos em todo o país enfrentaram disputas inesperadamente acirradas, DeSantis, 44, obteve uma vitória esmagadora de quase 20 pontos sobre o desafiante democrata Charlie Crist, incluindo uma clara maioria entre os eleitores latinos.
Há quatro anos, em comparação, ele ganhou o governo da Flórida com uma vantagem de menos de meio ponto percentual.
A vitória alimentará ainda mais as especulações de uma possível corrida presidencial em 2024 com a presença desse político, que tem sido apelidado por analistas americanos como “Trump com substância” ou “Trump 2.0”.
Em sua festa da vitória em Tampa na noite de terça-feira (8/11), seus apoiadores gritavam “mais dois anos!” – em clara referência ao desejo de que ele deixe a Flórida em 2024 para disputar a Casa Branca.
Entre aqueles que agora veem DeSantis como um candidato mais forte à Casa Branca do que Trump está Mike Cernovich, um comentarista de direita que já foi descrito pelo site Politico como um “incansável torcedor de Trump”.
“Trump tem zero chance em 2024 em geral. Depois desta noite, isso não está em questão”, tuitou Cernovich na noite de terça-feira. “DeSantis em 2024 ou aceite a derrota total”.
A perspectiva de enfrentar DeSantis em dois anos não passa despercebida por Trump, que alertou que DeSantis “poderia se machucar muito” e que revelaria “coisas sobre ele que não seriam muito lisonjeiras”.
Em entrevista à BBC, Patrick Ruffini, pesquisador e estrategista republicano, descreveu Trump como um “animal ferido”.
Ainda no Twitter, na manhã desta quarta, o ex-porta-voz de Trump e CEO da Gettr Jason Miller saiu em defesa do ex-chefe, diante dos resultados.
“Quanto ao meu ex-patrão, o presidente Trump, ele ainda é o líder do Partido Republicano, e houve muitos sinais positivos no Arizona, Wisconsin e Geórgia na noite passada, os três Estados que ele precisa vencer em 2024.”
O balaio de endossos de Trump – e seus resultados controversos
Antes das eleições de meio de mandato, Trump endossou dezenas de candidatos ao Congresso, bem como outros que disputam eleições para governadores e deputados estaduais.
Embora os resultados finais da eleição ainda não sejam claros – e possam seguir indefinidos por algum tempo – está cada vez mais claro que os resultados de Trump foram, na melhor das hipóteses, mistos.
Dos candidatos de destaque ao Senado que ele endossou, por exemplo, apenas um – o republicano de Ohio JD Vance – obteve uma vitória clara, superando o deputado democrata Tim Ryan.
Outros candidatos endossados por Trump, incluindo o candidato ao Senado pela Pensilvânia, Mehmet Oz, e o candidato a governador de Michigan, Tudor Nixon, perderam, enquanto os resultados de várias outras disputas ainda precisam ser totalizados.
“Esta manhã liguei para John Fetterman e o parabenizei. Desejo a ele e sua família tudo de bom, tanto pessoalmente quanto como nosso próximo senador dos Estados Unidos. Fazer campanha em toda a nossa região foi a honra de uma vida, e vou levar comigo as memórias e as pessoas que conheci”, afirmou Oz em uma declaração em que concedia a derrota sem citar qualquer tipo de fraude eleitoral, como se tornou costumeiro entre trumpistas.
Antes da eleição, John Hudak, membro sênior da Brookings Institution, com sede em Washington DC, disse que as derrotas dos candidatos endossados por Trump poderiam “levantar dúvidas sobre sua perspicácia política” entre potenciais apoiadores ou eleitores indecisos.
Até agora, Trump descartou que possa ser responsabilizado pelas derrotas de seus candidatos. Em sua rede Truth Social, o ex-presidente elogiou uma “grande noite” para seus candidatos e se gabou de que 174 de seus nomes venceram, em comparação com apenas 9 derrotas.
Na noite da eleição, ele também disse que deveria “receber todo o crédito” pelas vitórias e “não ser culpado” pelas derrotas.
Ainda assim, alguns já começaram a culpar Trump pelos resultados, em um processo que não deve acabar por aqui.
Com baixa popularidade e uma inflação em cerca de 8% ao ano, distante da meta de 2%, o governo de Joe Biden já esperava perder o controle tanto da Câmara quanto do Senado nas eleições de meio de mandato.
Historicamente, o presidente é punido pelos eleitores nesse pleito – foi o que aconteceu em 36 das 39 eleições de meio de mandato.
A margem de vitória dos Republicanos na Câmara, porém, tem se mostrado bem mais magra do que o antecipado. E no Senado é possível que os democratas mantenham sua estreita maioria.
Um lado bom?
Trump ainda pode ter alguns motivos para estar satisfeito com os resultados de terça-feira.
O principal deles é o fato de que uma Câmara dos Deputados controlada pelos republicanos – o resultado mais provável – poderia desmantelar o comitê que investiga o motim de 6 de janeiro de 2021, que há muito procura conectar Trump à invasão do Capitólio.
O comitê recentemente emitiu uma intimação legal ordenando que Trump testemunhasse até 14 de novembro, um dia antes de seu “grande anúncio”.
“Isso provavelmente será desmantelado”, disse Grant Reeher, professor de ciência política da Universidade de Syracuse, referindo-se ao comitê investigativo.
Além disso, a eleição elegeu dezenas de negacionistas da vitória de Biden nas eleições de 2020 para assentos no Congresso ou nos Estados, o que significa que Trump pode contar com um bloco significativo de aliados políticos que acreditam – ou dizem acreditar – que ele foi o legítimo vencedor da eleição presidencial anterior.
As pesquisas também mostram que Trump continua popular entre vastas faixas da base de eleitores republicanos, um fato que qualquer candidato em potencial – seja DeSantis ou outro republicano de alto nível – terá que enfrentar se espera substituí-lo como candidato favorito do partido para a Casa Branca.
“Alguém que procura substituir Trump no topo do Partido Republicano não pode fingir que Trump não está lá. Trump é uma personalidade enorme, que faz de cada disputa uma batalha de personalidades”, escreveu David Frum, editor da The Atlantic que trabalhou no governo do ex-presidente George W. Bush.
“Recusar-se a entrar no jogo não é uma opção, porque ele vai disputar, goste-se ou não. Não há escolha a não ser disputar também.”
* Com Mariana Sanches, de Washington
Fonte: BBC News | Brasil