Ligia Guimarães
De São Paulo para a BBC News Brasil
“Minha avó tinha origem indígena e adorava me contar sobre como era sua vida antes de morar na cidade. Foi assim que eu me tornei uma apaixonada por ouvir e contar histórias. E eu cresci buscando honrar sempre tudo que ela me ensinou. Mas, infelizmente, ela não conseguiu me ver trabalhando com o que eu amava. Por isso, mudar essa realidade se tornou a minha maior motivação.”
O texto talvez pareça pessoal demais para estar em um currículo, mas a publicação acima é um trecho do que está escrito na seção “sobre” do perfil do LinkedIn da redatora gaúcha Maiara Rodrigues, 34 anos, que mora em Curitiba.
Ela o escreveu em um momento de saudade da família, que mora em Gravataí (RS), quando havia sido desafiada a criar um texto que não apenas resumisse sua trajetória profissional, mas também refletisse sua personalidade.
E não é que deu certo? O depoimento, em que ela conta as origens familiares do seu amor por contar histórias e termina oferecendo seus serviços de redação, foi justamente a chave para que ela finalmente conquistasse seu emprego atual, do jeito que ela sonhava.
“A recrutadora me ligou e disse olha, eu gostei muito do teu do teu perfil, eu vi os conteúdos e acho que é isso que a gente tá precisando. Mas o que me conquistou mesmo foi a tua apresentação do LinkedIn: quando eu li eu já te mandei mensagem por que vi que você era uma storyteller”, lembra Maiara, que passou por um período de aprendizado para dominar o uso da rede.
“Eu me candidatava para um monte de coisa, mas no meu e-mail só chegavam as rejeições”, conta a jovem formada em Letras, que não entendia o motivo do fracasso em suas tentativas de mudar de emprego: ela havia preenchido cuidadosamente todas as seções de seu perfil, detalhado uma a uma todas as suas experiências profissionais, suas competências, sua formação e habilidades.
O sucesso veio depois que ela investiu em sessões com uma mentora que lhe ajudasse a deixar seu perfil na rede profissional mais atraente e estratégico.
“Foi quando eu comecei a criar conteúdo usar meu LinkedIn de maneira mais estratégica que começou a acontecer muito de recrutadores me convidarem para conversar, e não mais eu ter que me candidatar em um monte de vaga, em várias plataformas e mandar um monte de currículo”, diz a redatora.
O texto do “sobre” que fez tanto sucesso havia sido reescrito por Maiara há pouco tempo. A versão anterior, mais tradicional, havia sido feito por uma consultora de recursos humanos.
“Minha mentora disse que aquele texto não refletia minha personalidade e pediu que eu escrevesse outro”, diz.
“Acabei fazendo esse mais com a minha cara, em um momento de desabafo e saudade da família. Contei como eu queria estar com eles e como eles influenciaram minha trajetória profissional”.
Em um país em que 8,1 milhões de pessoas estão procurando trabalho, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), é fácil desanimar diante das rejeições e sem saber o que fazer para melhorar.
Para ajudar quem busca um emprego em 2024, a BBC News Brasil consultou recrutadores, representantes do LinkedIn, influenciadores “top voices” e gente que já conquistou a vaga dos sonhos pela rede para dar dicas de como tornar o seu LinkedIn mais eficiente.
1. ‘Basicão’ completo e boa foto de perfil
O que é uma foto ideal para o LinkedIn? De acordo com as dicas da gerente de marketing da empresa, Lydia Abbot, é importante escolher uma imagem que permitiria a um recrutador te reconhecer se o encontrasse amanhã. Evite fotos tiradas há muito tempo, quando seu cabelo era de outra cor ou numa época em que você não usava óculos.
Se você mudar sua aparência drasticamente, considere tirar uma foto nova, recomenda Abbot, em um artigo sobre boas práticas.
Garanta também que a foto que tenha boa resolução, na qual seu rosto ocupe 60% do espaço (não vale foto de corpo inteiro) e com uma roupa que você usaria no trabalho. Evite fundos muito poluídos visualmente e uma luz natural.
Não exagere nos filtros (tem que parecer com você pessoalmente, lembra?) e peça para alguém tirar a foto para você: selfies não são a melhor opção.
Outra recomendação da empresa é preencher 100% do perfil, sem deixar nenhuma seção de fora: mantenha seu cargo atualizado, informe instituições de ensino em que estudou, localização e habilidades, tanto técnicas quanto interpessoais.
Caso você tenha interesse em trabalhar fora do Brasil, é possível adicionar seu perfil em outra língua.
“Mesmo que não tenha nenhuma experiência profissional, inclua em seu perfil trabalhos voluntários, intercâmbios, trajetórias acadêmicas, idiomas e certificados”, recomenda o diretor geral do LinkedIn para a América Latina e África, Milton Beck.
2. Pesquise as palavras-chave
No Linkedin, as palavras que você escreve no perfil têm poder.
“Os(as) profissionais podem pesquisar na plataforma as vagas parecidas com as que desejam se candidatar e ver quais palavras-chave estão sendo mais usadas nas descrições – habilidades, experiências que têm e podem incorporar na seção ‘sobre’ e em ‘competências’ de seus perfis”, diz Beck.
Andreza Maia, cofundadora e diretora de influência da Futuros Possíveis e LinkedIn top Voice Creator explica que a inteligência artificial por trás do LinkedIn é formatada com o objetivo de encontrar palavras que encontram pessoas.
“Dentro da plataforma há um mecanismo de buscas para pessoas recrutadoras que vão encontrar palavras e, após isso, encontrar pessoas. Então por exemplo, se eu busco contratar uma jornalista, eu pesquiso no LinkedIn o temo jornalista + outra palavra específica (ex: editora) e a partir dessa palavra eu encontro pessoas”, diz Maia.
3. Evite clichês
Outra recomendação da rede é a de evitar os termos muito “batidos” e repetidos pelos candidatos.
No blog de vendas do LinkedIn, uma dica da gerente de conteúdo de marketing Jane Deehan é a de evitar o uso de palavras que normalmente são super exploradas pelos usuários da rede, como especializado”, “focado”, “estratégico”, “experiente”, “apaixonado”, “especialista”, “criativo”, “inovador”.
“Não estou dizendo que você não pode se descrever como essas coisas. No entanto, apenas usar essas palavras não convencerá as pessoas de que você possui essas qualidades. Você também precisa demonstrá-los”.
Um modo de listar suas habilidades com mais eficiência é seguir a dica da redatora Maiara Rodrigues: ao clicar em uma vaga que você deseja, o próprio LinkedIn lista quais habilidades exigidas pelo anunciante você já tem e as que ainda faltam. A partir daí, é só ir atrás de complementar.
“Tem um monte de palestra online gratuita e daí consegue completar as competências que tá pedindo nas vagas que a pessoa tem interesse”. “Isso vai deixar mais fácil você ser localizado.”
Se você encontrar uma vaga que peça habilidades em SEO, por exemplo, pode assistir a um curso online e já listar SEO como competência; a rede permite que você cite até 50, pondera a redatora, elogiando a facilidade da plataforma.
4. Preciso movimentar bastante meu LinkedIn para ser contratado?
Não. Andreza Maia, cofundadora e diretora de influência da Futuros Possíveis e LinkedIn top Voice Creator, explica que o Linkedin tem duas vertentes: a de plataforma para buscar emprego e a de relacionamentos (que podem até lhe render trabalhos e parcerias profissionais.
“Não movimentar o seu perfil faz diferença para os relacionamentos; mas para a busca de emprego não é tão relevante porque a pessoa recrutadora vai encontrar o seu perfil por meio da sua experiência e dos insumos que você traz no perfil”, diz.
A empresa, no entanto, diz que ser mais ativo na rede ajuda a aumentar o alcance de suas postagens e conexões, ajudandando a otimizar as buscas. “Importante participar interagindo com postagens relevantes, compartilhando insights da sua área de atuação e contribuindo para discussões pertinentes”, lembra o diretor geral do LinkedIn.
5. Conexões com quem pode te empregar – e seja gentil
Sobre estabelecer relacionamentos profissionais na rede, Maia diz que o melhor caminho para estabelecer aproximação com empresas que te interessam é convidar recrutadores a fazerem parte da sua lista de contatos, e não pessoas de outros cargos, como CEOs ou gerentes.
“Se apresente, mas lembre-se de que aquela pessoa não é obrigada a te contratar”, pondera, dizendo que a falta de educação nas redes sociais é uma queixa constante entre profissionais do RH.
“Acontece muito no Linkedin das pessoas se apresentarem, já encaminharem o currículo e dizer ‘olha, fulana, confere aí o meu currículo para essa vaga, eu gostaria de participar da entrevista aqui’.”
Então, como fazer? Se apresente com formalidade e simpatia, agradecendo pela atenção e por aceitar sua solicitação de contato, usando expressões como por favor e obrigado.
“Comece uma conversa e espere a pessoa responder. Por que eu falo que não ter uma resposta também é uma resposta né? Se a pessoa não quiser falar comigo ela não vai responder à minha mensagem e a partir disso eu parto para outra”, diz Andreza Maia.
Maia dá dicas de como abordar tais contatos. “Por exemplo: eu vi uma vaga na sua empresa para a qual eu queria muito me candidatar, vi que fulana é recrutadora mas eu não tenho o contato dela, você conseguiria me conectar?”
Ou “consegue me orientar com alguma dica para a entrevista?”, caso você já tenha se inscrito. Conversas como essa podem aumentar as chances em comparação a candidatos que apenas se inscrevem por candidaturas simplificadas, por exemplo.
Outra dica da equipe do LinkedIn é sincronizar seu perfil com seus contatos do email, para que a rede sugira as pessoas com as quais você poderia se conectar.
6. Use o perfil para contar sua história
Assim como fez Maiara, citada no início da reportagem, a recomendação consensual entre especialistas é a de que todo candidato a emprego use o perfil para contar a própria história de maneira autêntica. O mais importante é justamente a seção “sobre” — a sua “vitrine” para os recrutadores.
“Não tenha medo de investir algum tempo, tente alguns rascunhos e apresente seu resumo a pessoas que você conhece. Esta é a sua peça mais pessoal de marketing de conteúdo — e vale a pena o esforço”, recomenda a rede entre suas melhores práticas.
“Um perfil genérico que parece um currículo não se destacará. O que você traz de diferente para a mesa? Por que você é apaixonado pelo seu trabalho? O que faz você, você? Esses são ingredientes essenciais para ganhar a confiança das pessoas e motivá-las a se conectar com você. Seja autêntico, escreva na primeira pessoa — não muito formalmente.”
7. Treine contar sua história
Se você não souber resumir sua trajetória para alguém na vida real offline, dificilmente o fará de maneira eficiente no LinkedIn. O treino para aprender envolve relembrar os fatos da sua vida e chegar a um encadeamento e edição que faça sentido para seus objetivos.
No livro Seja Egoísta com a sua carreira, o mentor e palestrante Luciano Santos diz que uma boa técnica para treinar é contar a sua trajetória em cinco minutos. Eventos considerados negativos pelo profissional, como desgostar de um emprego ou decidir trocar de faculdade, podem ser apresentados de maneira positiva.
“A parte mais legal é que, quanto mais você pratica, melhor fica a sua capacidade de contar sua história.”
Como parte do treino ele também recomenda algumas ações, como listar de três a cinco principais eventos pessoais e profissionais que aconteceram na sua vida; pode ser desde a faculdade ou a partir do início da sua vida profissional.
“É importante não citar apenas os eventos que considera relevantes, mas sim todos nos quais gastou tempo e energia.”
Reflita sobre todos eles. O que aprendeu? Essas experiências fizeram de você uma pessoa mais forte? Para cada um desses eventos, crie pequenas histórias que possam ser contadas em tempo de um a dois minutos; junte todas essas histpórias em uma narrativa e teste o produto final.
Santos destaca, também no livro, que nem só de grandes vitórias e sucessos se faz uma boa história profissional; o importante é focar nos aprendizados em cada experiência para a sua formação.
“Precisou trocar de faculdade no meio do caminho? Conte como você finalmente descobriu o que queria fazer e como isso o impactou positivamente. Ficou alguns anos em um emprego que não era o que você queria? Conte como você aprendeu tudo o que tinha para aprender lá e que estava pronto para crescer e dar o próximo passo”, diz o autor.
8. Descubra e melhore seu SSI
Muita gente não sabe, mas o Linkedin tem um indicador para medir a sua capacidade de cada usuário de “se vender” na rede: é o Social Selling Index (índice de vendas sociais, em tradução livre); ele pode te ajudar se o seu objetivo é criar relacionamentos profissionais e uma comunidade para chamar de sua, mais do que para se candidatar a vagas.
De 0 a 100, o LinkedIn SSI avalia a sua eficácia na rede baseado em quatro elementos: marca profissional, conexões, engajamento e relacionamentos. Para checar o seu, é só se logar no LinkedIn e clicar na página do indicador.
“Em resumo, o SSI mostra como os usuários(as) têm utilizado a rede e suas ferramentas para um posicionamento estratégico. Os dados trazidos pelo Índice são uma ótima forma de saber quais pontos precisam ser melhorados nos perfis, especialmente para aqueles que usam o LinkedIn com objetivos de negócios/vendas”, diz Beck, do LinkedIn.
9. Evite erros
“Fazer um post pedindo emprego e marcar todas as empresas é um erro gravíssimo”, alerta Andreza Maia, da Futuros Possíveis. Isso porque, em posts coletivos como esse, o resultado é mais ruído.
“Você acaba causando uma polêmica, porque no geral mais pessoas vão pedir emprego nesse post ou vão reclamar dessa empresa e você não chega no seu público-alvo, que são os recrutadores”, diz.
O selo #opentowork (aberto a oportunidades de trabalho, em tradução livre) também é prática muito popular no LinkedIn, mas dispensável na visão de Maia porque não costumam trazer resultados.
10. Seja autêntico
Andreza Maia destaca que a autenticidade é a ferramenta mais valiosa no LinkedIn. Por isso, em tempos de inteligência artificial, é muito importante evitar plágios ou textos que não tenham sido escritos pelo próprio autor.
“Você olha para alguns conteúdos e percebe que não são genuínos, não focam nem na pessoa e nem na comunidade, mas em entregar algo por likes”, alerta.
“O objetivo da comunidade é informar, compartilhar conteúdo e fazer parte daquilo, de fato. Ao copiar você perde a sua autenticidade e a oportunidade de fazer algo diferente ali dentro.”
Fonte: BBC News | Brasil
Fotografia: GETTY IMAGES