Desafios a nossa maneira de pensar o Desenvolvimento

Pedro Sisnando Leite *

O grande desafio de uma era de crise econômica é conseguirmos uma compreensão melhor e mais profunda do processo de desenvolvimento econômico e social de nosso País e do mundo. Com a globalização o mundo está cada vez mais conectado. Muitas ideias que professávamos há relativamente pouco tempo, parece que se tornaram obsoletas.

As mudanças que ocorrem agora a nossa volta têm implicações de longo alcance não apenas para a nossa vida pessoal, mas também para o território nacional, estadual ou local. Estamos na era da tecnologia da informação. Um dos progressos que estão transformando não só as comunicações e outros aspectos do quotidiano, mas desafiando os próprios conceitos do papel do governo na sociedade. Especialmente depois do colapso do socialismo prático da antiga União Soviética e da emergência do capitalismo do Estado Chinês.

Logo depois do alvorecer da era nuclear, Albert Einstein observou que tudo mudaria, exceto nossa maneira de pensar. As revoluções na ciência e tecnologia abriram, no entanto, possibilidades aparentemente ilimitadas para transformar nosso mundo. Ainda que não possamos esperar que essas mudanças solucionem todos os problemas. Em muitos aspectos, o ritmo das mudanças tem sido mais rápido do que nossa capacidade de captar suas ramificações.

Na década de 70, muitos se preocupavam com a ideia de que o nosso planeta era pequeno e tornava-se cada vez menor, com o rápido crescimento da população, segundo a teoria malthusiana. Que os recursos naturais eram limitados e estavam sendo exauridos e que haveria limites inevitáveis para o crescimento. Os cientistas do “Clube de Roma” chegaram a estabelecer datas para uma catástrofe como consequência do esgotamento das fontes de combustíveis líquidos. Havia, em resumo, um profundo pessimismo sobre o futuro de nosso planeta e da própria humanidade.

Esse espírito negativista foi substituído, na década de 80, por uma nova aspiração de progresso, em face das altas taxas de crescimento da economia mundial, do milagre japonês e as mudanças na economia brasileira. Já nos anos recentes, a aparente prosperidade mundial foi mais uma vez abalada pela crise financeira dos Estados Unidos e os problemas econômicos da Comunidade Europeia do euro.

As oscilações que provêm dessas turbulências motivaram dias de incerteza nas economias emergentes, que dependem ou não das nações em estado de choque na economia. O Brasil é um desses países que está numa certa situação de quarentena do que poderá acontecer doravante. Até agora o nosso País tem conseguido manter certa estabilidade da economia e tendências de crescimento.

Diante de um quadro dessa natureza vale a pena relembrar mais uma vez Albert Einstein: “Talvez os maiores desafios que enfrentamos sejam a nossa maneira de pensar”. As mudanças estruturais do sistema econômico e o progresso serão uma constante, enquanto mantivermos uma sociedade aberta. Em que os homens sejam livres para pensar, pesquisar, sonhar e transformar seus sonhos em realidade. Não alcançaremos isto de outro modo.

Devemos desejar permanentemente uma sociedade dedicada ao bem de todos, baseada na compreensão fundamental de que a livre busca da felicidade individual pode beneficiar a nossa vontade social de realizar um desenvolvimento econômico verdadeiro, conforme nossos ideais de uma sociedade justa.

Acredito, assim, que a base da motivação de nossa população deve está voltada para a transformação dos nossos conceitos políticos e morais. Mas é preciso que haja certa revolução de nosso modo de pensar, que foi se acomodando a uma forma de sociedade paternalista, conformista e relativista. É necessário aprimorar os mecanismos de democracia representativa e promover a democracia participativa, como estipula a Constituição Brasileira de 1988. “O povo brasileiro precisa recuperar a esperança”, proclamam os Bispos da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).

Por tanto, é necessário começar imediatamente uma revolução educacional, elaborar o planejamento de uma politica que leve a um desenvolvimento mais humano da sociedade. O combate aos desperdícios de recursos com programas faraônicos ou enclaves industriais concentradores de renda. O ataque aos desníveis sociais inadmissíveis moralmente e a violência que se generaliza nas praças públicas e na porta de nossas residências.

Em vários pronunciamentos, o Conselho Permanente da CNBB tem alertado a população sobre as repetidas ocorrências de corrupção e atos ímprobos na administração pública. É generalizada a indignação passiva da população brasileira diante da violação dos valores fundamentais da sociedade.

Um exemplo positivo do que o povo pode fazer foi o movimento da “Ficha Limpa”, que dificulta a cultura política do domínio dos cargos públicos por profissionais parasitas sem o mínimo de caráter e honestidade. A Doutrina Social da Igreja considera que a ambição desmedida de riqueza e poder leva a degradação moral dos costumes, como falava o profeta Isaias (Is 1,23). “Eles gostam do suborno, correm atrás dos presentes, não fazem justiça ao órfão e a viúva nem chegam até eles”.

Não se justifica, na realidade, a existência no Brasil das maiores fortunas do mundo, “verdadeira ilhas de luxo” em oceanos de miséria. O que nos leva a concluir que o futuro do nosso País está na dependência do que nós devemos pensar e fazer daqui para frente. A questão dramática e desafiadora do nosso tempo é superar essa desigualdade entre o pobre e o rico que agride os mais elementares sentimentos de amor ao próximo e a dignidade humana.

Há décadas, estudo esse assunto na busca de explicações para solucionar essas disparidades. Cheguei a morar num Kibutz (Israel) onde era adotada a organização comunista perfeita e fiz estudos na África onde prevalecem ainda hoje formas tribais de organização social. Conheci muitas experiências internacionais que são exemplos de superação desses problemas e que construíram sociedades onde o progresso é patrimônio de todos. Escrevi muitos livros de teoria econômica e de relatos empíricos sobre esses assuntos (alguns podem ser acessados pelo site gratuito): www.vivali.com.br/newsletter/psisnando

As conclusões que se pode auferir de todas essas investigações é que as soluções para esses problemas são complexas, mas podem ser simplificadas de modo elementar. O que devemos pensar e dar prioridade não são apenas criar a riqueza. Não basta apenas o crescimento da renda, por mais rápida que seja. O que precisamos é salvar as pessoas da fome, da humilhação do trabalho opressor com baixas remunerações.

Em nosso tempo de tantos recursos públicos roubados em todas as esferas do setor público para fins escusos, não se pode aceitar a existência de elevados índices de analfabetismo absoluto e funcional, delinquência generalizada e marginalização econômica e social. Os esforços da administração pública deveriam estar concentrados nessas questões vitais, além de outras iniciativas essenciais.

A educação da Juventude absorve atualmente muitos recursos, mas é perversa e desastrosa para o desenvolvimento da nossa população. Não é de qualidade. Dá-se mais importância à decoreba e ao ensino de generalidades do que a orientação vocacional das crianças e das habilidades para resolver os problemas da vida real. O estudante depois de concluir a etapa fundamental das escolas públicas é em parte analfabeta funcional e os poucos que concluem a 2ª série não sabem o que seguir e estão despreparados para o ensino superior. O Ministério da Educação sabe disso ou deveria saber pelos muitos estudos existentes sobre o assunto.

Não basta, pois, apenas criar mais escolas é preciso reformular o currículo das escolas que já existem. A reforma educacional é a grande mudança que o Brasil deve realizar urgentemente. Essa reforma do ensino é uma responsabilidade governamental, mas deve ser considerada um projeto nacional e também diz respeito a cada pai e a cada pessoa.

É preciso que ocorram transformações também nas estruturas e nos hábitos educacionais da população de modo geral. Deve haver um combate sistemático a corrupção política, empresarial, pessoal e econômica, que tanto prejudicam os esforços do desenvolvimento.

A corrupção é uma chaga social que custa muito caro a toda a população. Ela explica mesmo até a manipulação de falsas estatísticas pelos órgãos governamentais. Sobre o assunto, aliás, em visita recente ao Leste Europeu, tomei conhecimento de que os três maiores males que a população daquela região rejeitaram do governo do sistema soviético fracassado foram a corrupção, a falta de liberdade e a falsidade das informações, especialmente sobre a economia.

Temos de estar atentos a propaganda enganosa, a informações montadas para mostrar resultados de programas não executados plenamente, a manipulação de políticas que apenas ajudam a manutenção do poder. É preciso reeducar a mentalidade da população que procura levar vantagem sobre tudo e sobre todos; ver algo errado e dizer: deixa prá-lá. “Todos roubam, então vamos roubar também”.

Em lugar dessa maneira de pensar, que tende a se generalizar no Brasil, devemos defender aqueles princípios que são referenciais para o alcance de um verdadeiro desenvolvimento econômico humanizado. São eles a ética, a integridade e a responsabilidade. É necessário o respeito às leis e regulamentos e os direitos dos demais cidadãos, assim como o amor ao trabalho. O esforço pela poupança e pelos investimentos deve prevalecer sobre os gastos ostensivos. A pontualidade e a solidariedade são outros princípios que precisam fazer parte da educação de todos e dos critérios de gestão dos setores público e privado.

É oportuna a advertência feita pelo deputado Ciro Gomes através do Jornal O Diário do Nordeste: “O Brasil não tem um projeto organizado, desenhado e protegido por Lei, que prepare nosso País para enfrentar o futuro. No Brasil tudo está fora do lugar”. Por sua vez, o ex-ministro de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, Roberto Mangabeira Unger, no Projeto idealizado para o desenvolvimento do Nordeste, afirma: “ O que está em jogo é a reconstrução da economia de mercado a serviço da inclusão social e da ampliação de oportunidades. Reconstrução que não pode ser por revolução da luta de classes, mas passo a passo e parte por parte”.

Quanto ao Nordeste, Roberto Mangabeira Unger é bem explicito: “O Nordeste é o maior órfão do modelo de desenvolvimento construído no país no último meio século. Convém ao País que o Nordeste se rebele contra esse modelo de desenvolvimento. Ao se rebelar contra ele, lutará pelo Brasil”.

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