O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, deve renunciar nesta quinta-feira (07/07) ao posto de líder do Partido Conservador, mas ele pretende continuar como primeiro-ministro até sua sucessão, segundo a BBC apurou.
O partido está dividido se Johnson deve continuar ou não no posto de primeiro-ministro. De toda forma, a expectativa é que uma nova disputa pela liderança do Partido Conservador ocorrerá neste verão no hemisfério norte (ou seja, até setembro) e Johnson continue como primeiro-ministro até o outono no hemisfério norte (com início no fim de setembro). No Reino Unido, o primeiro-ministro é o líder do partido que tem maioria na Câmara dos Comuns.
A crise política que levou à decisão de renúncia foi desencadeada pela nomeação pelo ex-primeiro-ministro do aliado e parlamentar Chris Pincher, do Partido Conservador, para um cargo no governo, mesmo após ser informado de uma queixa contra Pincher por assédio sexual.
A mais recente crise foi iniciada após o governo mudar as versões sobre o conhecimento por parte do primeiro-ministro acerca dessas denúncias de abuso sexual.
Nos últimos dias, ele tem enfrentado uma rebelião interna em seu governo, com aliados próximos favoráveis à sua renúncia. Mas até aqui estava resistindo a deixar o cargo. Johnson disse aos parlamentares que não seria correto “se afastar” em meio a pressões econômicas e à guerra na Ucrânia.
A queda de Johnson foi precedida pela renúncia de dois dos ministros mais importantes do governo: Sajid Javid (Saúde) e Rishi Sunak (Finanças). Ambos são nomes fortes para suceder Johnson. Em seguida, dezenas de assessores deixaram o cargo no governo.
A crise atual se soma a outras enfrentadas por Johnson. Esses episódios ocorrem menos de um mês depois que o primeiro-ministro enfrentou uma moção de desconfiança em que 41% dos parlamentares de seu próprio partido votaram contra ele.
Aquela tentativa de removê-lo do cargo ocorreu em decorrência das fotos e evidências de reuniões e comemorações na sede do governo que vieram à tona enquanto o resto do país estava confinado em razão das restrições impostas pelo próprio governo de Johnson durante a pandemia de covid-19.
Abaixo, entenda como deve ser feita a escolha do sucessor de Johnson e os detalhes da mais recente crise que afeta o primeiro-ministro conservador.
Como os conservadores escolherão um novo líder?
Diante de uma renúncia, o Partido Conservador faz um novo processo de escolha de líder. Nessa eleição para um novo líder partidário, os candidatos precisam do apoio de oito deputados conservadores para concorrer.
Se houver mais de dois candidatos, os parlamentares conservadores realizarão uma série de votações até que restem apenas dois:
-Na primeira rodada, os candidatos devem obter pelo menos 5% dos votos para permanecer na disputa (atualmente, 18 deputados)
-Na segunda rodada, eles devem obter 10% (atualmente, 36 parlamentares)
-Nas rodadas seguintes, o candidato com o menor número de votos é eliminado
Quando sobrarem dois deputados, todos os membros do Partido Conservador em todo o país – não apenas os deputados – votarão no vencedor.
O calendário para cada disputa é decidida pelo chamado Comitê de 1922 (grupo parlamentar do Partido Conservador na Câmara dos Comuns britânica).
Quem vencer a disputa para liderar os conservadores se tornará o líder do partido com o maior número de parlamentares no Parlamento. Assim, a rainha pedirá que forme um governo.
No momento, não há um nome para Johnson considerado “óbvio”, mas existem vários candidatos em potencial, como os ex-ministros Rishi Sunak, Jeremy Hunt, Michael Gove e Sajid Javid. Outros nomes fortes para a disputa ainda continuam como ministros, como Nadhim Zahawi (Finanças), Ben Wallace (Defesa) e Liz Truss (Relações Exteriores).
Como a crise atual começou?
Em 30 de junho, o jornal britânico The Sun publicou que Chris Pincher, então deputy chief whip da bancada do Partido Conservador no Parlamento, apalpou dois homens em um clube privado em Londres.
O deputy chief whip é um posto que, no sistema político britânico, tem como atribuição garantir que parlamentares do partido votem conforme a orientação das lideranças.
Pincher, que havia sido nomeado para esse cargo por Johnson em fevereiro deste ano, renunciou imediatamente.
Em poucos dias, a mídia britânica publicou informações de, pelo menos, seis outros casos de suposta conduta sexual inapropriada de Pincher nos últimos anos.
Pincher, que foi suspenso pelo Partido Conservador, pediu desculpas e disse que cooperará totalmente com as investigações sobre sua conduta e está buscando “apoio médico profissional”.
Por que Boris Johnson está envolvido nisso?
Embora o primeiro-ministro britânico não esteja envolvido nessas denúncias de conduta sexual inapropriada, o escândalo coloca Pincher em uma posição difícil, porque o julgamento feito pelo premiê a respeito está sendo questionado, assim como a transparência com que o governo tratou o caso.
Em 1º de julho, o governo disse à imprensa que Johnson não estava ciente de nenhuma alegação contra Pincher antes de sua nomeação. Um porta-voz disse que o primeiro-ministro não estava ciente de “acusações específicas” sobre Pincher. E essa foi a mesma posição que vários membros do gabinete mantiveram nos dias seguintes.
No entanto, em 4 de julho, o porta-voz disse que Johnson estava ciente de “alegações que foram resolvidas ou não avançaram para a fase de reclamação” e que não foi considerado apropriado interromper a nomeação de Pincher devido a “alegações sem fundamento”.
Naquela mesma tarde, no entanto, a BBC revelou que Johnson havia sido informado sobre uma queixa formal sobre o “comportamento inapropriado” de Pincher enquanto trabalhava no Ministério das Relações Exteriores entre 2019 e 2020.
Esta queixa levou a um processo disciplinar que confirmou que o comportamento inadequado ocorreu.
Mais tarde, em uma entrevista à BBC, Johnson disse: “Houve uma reclamação que foi trazida à minha atenção especificamente… Foi há muito tempo, e chegou até mim em uma conversa. Mas isso não é desculpa, eu deveria ter feito algo sobre isso”.
O primeiro-ministro descreveu como “um erro” ter nomeado Pincher, que ele disse ter se comportado “muito, muito mal”, e Johnson pediu desculpas às pessoas afetadas.
“Isso é tudo sobre uma coisa: a verdade”, disse o editor de Política da BBC, Chris Mason, analisando a crise em curso no governo britânico, antes da informação de que Johnson deve renunciar. “Independentemente da onda de detalhes e acusações, tudo se resume a se as pessoas podem acreditar no que o Johnson diz”.
E a resposta do governo ao escândalo de Pincher foi mudando progressivamente à medida que outros elementos surgiram, como aconteceu durante o chamado Partygate, caso sobre encontros realizados na sede do governo durante o confinamento devido ao coronavírus, em que ficou provado que Johnson havia participado de algumas dessas reuniões sociais.
“As perguntas são sobre o que Boris Johnson sabia e quando ele sabia. E as respostas continuam mudando, muitas vezes em resposta a fatos desconfortáveis que demonstram que sua defesa anterior não tão sincera quanto poderia ter sido”, afirma Manson.
Fonte: BBC News | Brasil
Fotografia: PA MEDIA